STF: Cármen Lúcia analisa habeas corpus pró-Bolsonaro em meio a fake news

A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, está analisando habeas corpus (HCs) protocolados por apoiadores de Jair Bolsonaro (PL), que está preso na Superintendência da Polícia Federal em Brasília. A ministra intimou a defesa do ex-presidente a se manifestar sobre os pedidos, questionando a legitimidade dos impetrantes que não integram a defesa técnica de Bolsonaro. Paralelamente, uma história falsa sobre uma suposta cidadã comum, 'Dona Altair', que teria entrado com um HC em favor de Bolsonaro, viralizou nas redes sociais, expondo uma estratégia de desinformação.

STF avalia legitimidade dos HCs

Cármen Lúcia, em seus despachos, ressaltou a necessidade de preservar a estratégia processual da defesa técnica de Bolsonaro. Ela solicitou aos advogados do ex-presidente que se manifestassem sobre a autorização para a impetração dos HCs em até 24 horas. A ministra escreveu: “No caso em exame, a atuação da defesa técnica, validamente escolhida pelo paciente na Ação Penal n. 2.668, deve ser resguardada contra iniciativas paralelas que possam comprometer sua estratégia processual”. Ao longo das últimas semanas, a Corte já rejeitou diversos habeas corpus protocolados em prol de Bolsonaro.

A Fake News de 'Dona Altair'

Um caso de desinformação chamou a atenção nas redes sociais: a história de 'Dona Altair', uma suposta cidadã comum que teria entrado com um habeas corpus no STF para anular a condenação de Bolsonaro. A notícia viralizou entre os apoiadores do ex-presidente, acompanhada da foto de uma mulher e de dizeres como “a voz do povo no Supremo”.

No entanto, a história é uma deturpação da realidade. O habeas corpus foi de fato apresentado por Altair de Souza Melo, mas ele é um advogado paulista, não a 'Dona Altair' das redes sociais. Além disso, os argumentos da ação verdadeira são diferentes dos que foram divulgados na versão falsa.

“Fiquei sabendo através de uma amiga [da repercussão]. Ela mandou algumas coisas das redes sociais, e eu achei estranho. Impetrei um habeas corpus para o presidente, mas a minha tese é outra. Não tem base na decisão do ministro Luiz Fux [do STF]. Acredito que esteja havendo uma confusão, até porque estão me tratando como se eu fosse a dona Altair”, disse o advogado ao Valor.

Como as Fake News se espalham

A cientista política e antropóloga Isabela Kalil explica que as fake news frequentemente utilizam fragmentos de fatos verídicos para ganhar credibilidade. No caso da 'Dona Altair', apenas o nome do advogado e a existência da ação no Supremo são verdadeiros. O restante da história foi inventado para se encaixar em uma narrativa política.

Na versão falsa, o habeas corpus teria se baseado no voto do ministro Luiz Fux, que votou para absolver Bolsonaro no julgamento da trama golpista, e o relator seria o ministro Dias Toffoli, que o teria indeferido. Em resposta, 'Dona Altair' teria entrado com um recurso. Na realidade, o advogado Altair alega que a tentativa de golpe é um crime de responsabilidade da Presidência e que o caso deveria ser julgado pelo Congresso, não pelo Supremo. A relatora foi Cármen Lúcia, que rejeitou a ação. O advogado não entrou com recurso e o processo foi encerrado.

IA Validando Desinformação

A inteligência artificial do X, a Grok, chegou a afirmar que a história da 'Dona Altair' era verdadeira, justificando que estava em vários sites – todos ligados a bolsonaristas. Kalil aponta que as plataformas perderam a capacidade de checagem e que a IA tem poucos mecanismos para definir a qualidade da informação em portais de notícias falsos.

A Estratégia por Trás da Deturpação

Os elementos escolhidos para deturpar a informação não foram aleatórios. A figura da “cidadã comum”, o argumento citando o voto de Fux e a Segunda Turma do STF são componentes caros ao universo bolsonarista. Kalil explica que essa escolha de “alguém simples” ajuda a tornar mais críveis as histórias falsas: “A ideia do cidadão comum é de alguém que não tem nenhum interesse por trás, não tem uma agenda política.”

Partes da história também são omitidas para não desagradar o público-alvo da fake news. No caso do HC, não foi mencionada a ação de Altair em 2018 a favor de Lula. Diante da repercussão da fake news, o advogado expressou preocupação com a exposição e a propagação de informações falsas.

Embargo infringente: Última esperança de Bolsonaro?

Enquanto isso, na esfera jurídica, discute-se a possibilidade de Jair Bolsonaro ser absolvido através do embargo infringente, um recurso que permite a reavaliação de decisões não unânimes. Apesar de ser um instrumento processual em desenvolvimento, com pouca jurisprudência formada, o embargo infringente tem sido aceito pelo STF e, em 7% dos casos, reverteu decisões que prejudicavam os réus.

Se Gilmar Mendes, presidente da Segunda Turma, recusar o embargo infringente, cabe recurso ao plenário da Segunda Turma, onde a decisão final será tomada. Especula-se que Luiz Fux, Nunes Marques e André Mendonça votariam a favor da aceitação e análise do embargo, enquanto Gilmar Mendes e Dias Toffoli seriam contrários.

Diante deste cenário complexo, a análise dos habeas corpus por Cármen Lúcia e a tramitação de possíveis embargos infringentes representam momentos cruciais para o futuro jurídico de Jair Bolsonaro, em um contexto marcado pela disseminação de fake news e polarização política.

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